Em entrevista ao Observatório dos Técnicos em Saúde, Livia Mello, diretora do Departamento de Gestão da Educação na Saúde (DEGES/SGTES/MS) aborda os desafios da formação profissional de técnicos em saúde
O Observatório dos Técnicos em Saúde (OTS) trabalha com uma concepção ampliada de técnicos em saúde, na qual reúne trabalhadores com escolaridade variada - ensino fundamental, médio e superior - e formação profissional técnica ou Superior em Tecnologia, ou ainda com saberes adquiridos no e pelo trabalho. Entendemos que o trabalho exercido por essa ampla gama de profissionais que estão nas diversas frentes de cuidados em saúde é um trabalho complexo. Por isso, nossa defesa é o nível técnico como patamar mínimo de escolarização para todos eles. Gostaríamos de saber a sua opinião a respeito?
Compreendemos que a formação dos trabalhadores da saúde é fundamental para a construção de um modelo de saúde que atenda aos princípios e diretrizes do SUS. A defesa do nível técnico como base de escolaridade dos trabalhadores da saúde é, ao mesmo tempo, uma defesa importante e uma tarefa desafiadora pelo entendimento de que existe uma ampliação de cursos técnicos com grande predominância das instituições privadas. Assim não apenas é preciso ter um patamar mínimo de escolaridade para os trabalhadores e trabalhadoras da saúde, mas garantir que essa formação seja de qualidade e voltada para o trabalho no SUS, que é o maior campo de trabalho para esses profissionais.
O OTS tem indicado haver uma descontinuidade nos projetos e programas promovidos pelo Ministério da Saúde, voltados para a qualificação de trabalhadores técnicas em saúde. Ressalta a necessidade de haver uma política estruturada, que articule os ministérios da Saúde e da Educação, construída de modo tripartite, envolvendo municípios, estados e o Ministério da Saúde, de modo complementar, com participação de trabalhadores, estabelecendo metas de curto, médio e longo prazo. Qual a sua opinião a respeito?
A Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (SGTES) compreende a importância de uma política que normatize tanto a formação quanto o trabalho dos profissionais de nível técnico. Para tanto, está em fase de construção a Política Nacional de Gestão da Educação e do Trabalho na Saúde (PNGTES) que busca, entre outros aspectos, incidir sobre a formação e o trabalho de trabalhadoras e trabalhadores de nível técnico para qualificar tanto a educação, dentro dos princípios da educação permanente em saúde e da educação popular em saúde, como o trabalho a partir das noções de trabalho digno, decente, seguro, humanizado, equânime e democrático no SUS.
A atual gestão do DEGES/SGTES tem essa preocupação de construção de uma política voltada para esse contingente de trabalhadores?
A SGTES compreende que a PNGTES vai incidir sobre o trabalho em saúde de forma geral, um movimento importante para essa formulação tem sido a inclusão de elementos que promovam uma maior equidade das relações de trabalho, especialmente entre trabalhadores de nível técnico e nível superior.
Qual a sua expectativa quanto à possibilidade de a 4º Conferência Nacional de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (CNGTES) colaborar nesse sentido?
É sempre importante ressaltar os processos de controle social que ocorrem dentro do SUS, com especial atenção para as conferencias de saúde uma vez que evidenciam quais são as necessidades e indicar as políticas prioritárias para o SUS.
No caso da 4ª CNGTES, a expectativa da SGTES é de uma grande participação de trabalhadoras e trabalhadores técnicos do SUS que possam trazer propostas que melhor qualifiquem seu trabalho e sua formação e que essas possam ser incorporadas no texto da PNGTES para que, a partir disso, sejam realizadas mudanças nas áreas de gestão do trabalho e da educação.
Estudos realizados pelo OTS sobre trabalhadores do Eixo Ambiente e Saúde do Catálogo Nacional de Cursos Técnicos mostram que a maior parte das matrículas em cursos técnicos em saúde estão no setor privado. E isso contrasta com o fato de que a maioria desses técnicos atuam em estabelecimentos que atendem o SUS. Gostaríamos que você comentasse essa situação e nos dissesse:
- Se o DEGES/SGTES está pensando ou mobilizando estratégias para reverter essa situação?
O Departamento de Gestão da Educação na Saúde (DEGES) tem investido tanto na construção de diretrizes para os cursos técnicos da área da saúde como em programas que promovam a formação técnica voltada ao SUS em parcerias com diferentes instituições. No momento são construídas as diretrizes para o curso técnico em enfermagem e técnico em saúde bucal para que mesmo as formações ofertadas por instituições privadas sigam diretrizes curriculares alinhadas aos princípios, diretrizes e modelo de saúde do SUS.
Dentro das iniciativas do DEGES para a formação técnica podemos citar o Programa Mais Saúde com Agente, que já formou mais de 180 mil agentes e tem a previsão de alcançar, até 2027, a marca de 300 mil ACS e ACES formados como técnicos em todo o Brasil.
Aliado a esse processo o DEGES vem construindo, em junto a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV), uma inovadora especialização de preceptores com ênfase na educação técnica e profissional para os educadores dos trabalhadores técnicos possam estar melhor preparados para compreender e atuar dentro das especificidades da educação técnica nos territórios da APS e VS.
- Se o DEGES atua no sentido de haver regulamentação da formação técnica oferecida no setor privado?
A Comissão lnterministerial de Gestão da Educação na Saúde, criada por meio do Decreto 11.440/2023, tem como função debater e propor políticas que regulamentem e qualifiquem a área da educação em saúde da articulação entre os Ministérios da Saúde e da Educação. Dentro dessa Comissão foram instituídas subcomissões temáticas para tratar de pontos específicos com relevância para as áreas da educação e da saúde, dentre eles, a partir de uma proposição da SGTES, foi criada uma subcomissão para tratar especificamente da educação técnica na saúde.
- Se há alguma ação sendo feita no sentido de que a expansão da Rede Federal de Ensino recentemente anunciada seja acompanhada pelo aumento da oferta de Ensino Público na área da Saúde?
A expansão da Rede Federal de Ensino e a inclusão de cursos da área da saúde nos institutos federais será uma das pautas da primeira reunião da subcomissão temática de educação técnica na saúde.
- Se há interlocução com o MEC em algum desses sentidos.
Alguns diálogos estão sendo estabelecidos, posteriormente poderemos mencionar os encaminhamentos.
Jornalista: Paulo Schueler